sexta-feira, abril 24, 2009

Variações sobre o mesmo minuto

I

Em apenas um minuto a vida acontece
O que era antes deixa de ser
Se desmata a floresta
Milhões morrem de fome
A água escasseia
O ar se polui
Os milhares que nascem
Começam a morrer

II

Um minuto é sempre relativo
Dura uma fração de segundo
Ou vira eternidade

III

Em um minuto de paz
A serenidade do caos
O desejo mais antigo
A razão de tantos ais
A paixão arrebatadora
A desimportância do mal
A inutilidade da vida
A inevitabilidade da morte
Às vezes a vida dói de forma intensa
Mas ela ainda é o pouco que nos resta
De tudo o que sentimos ou esperamos
Nada nos sobra ao final de tudo

Não há segredo que não seja revelado
Não há olhos que vivam para sempre nublados
Mas há azuis que se perpetuam na escuridão
E ondas que arrebentam nas praias da solidão

Às vezes a vida parece um tanto indefinida
Como a fumaça de um navio no horizonte distante
E são os passos distraídos em noite de neblina
Que conduzem os sonhos para terras longínquas

Onde não há retorno para os dias desperdiçados
Se escondem soluços engolidos a seco
E cada lágrima que teve a existência impedida
Desfruta da liberdade que um dia lhe foi negada

Vãs são as horas para quem não existe no tempo
Inúteis os dias vividos, sofridos, perdidos
Em busca de respostas, sentidos e motivos
Somente o último dos fiéis sobreviverá
Um dia sem fim
Não é sequer o começo
Da mais bela história
Nunca antes contada

A carência da noite
Prenuncia a morte
Reverenciando a vida
Esquecendo o dia

Mas o fim de qualquer mundo
É o mesmo sono profundo
A ideia que nasceu primeiro
Um outubro em pleno fevereiro

A linha que se achava reta
É como vento que nos deixa alerta
Curvado à estrela que não surgiu
No crepúsculo de azul anil

O amanhecer é suave e belo
Gotas de orvalho, frescor e brisa
Aqueles que acordam nada percebem
Os que dormem são mais felizes
Há ainda um milagre para acontecer
Que poucos terão o privilégio de contemplar
Menos ainda os que conseguirão percebê-lo

Será um milagre estrondoso e fantástico
Como nunca se viu na face da terra
Abalando alicerces há anos consolidados

Será um dia de explosões e trovoadas
De vagalhões e ventos impetuosos
Com tempestades de areia e raios luminosos

Os homens perderão a fé em si mesmos
Para só assim reconhecer a sua estupidez
E de uma vez por todas deixar de existir

Mais um tanto de tempo e tudo se consumirá
De todas as expectativas essa não será frustrada
Mas até lá, os dias correrão lentos
Se fosse um sonho não seria tão belo
A ponto de esconder a lágrima do desprezo
Que se manifestou num simples aceno
Decretando que o adeus seria para sempre

O sol nasce e se põe e a tristeza permanece
Tão viva quanto a noite insone e perdida
Entremeada de soluços e espantos
Sem um tanto de descanso e paz

Alta madrugada, nenhuma estrela no céu
Todos os sons num silêncio ensurdecedor
A irônica companhia da solidão
E a ausência dos lábios que hipinotizam

O nunca não dura eternamente para quem ama
Sempre haverá uma luz que dissipa a escuridão
Sempre haverá amanhecer e o retorno do sol
Sempre haverá reencontros e perdão