Este é o poema dos meninos mortosOs estraçalhados sem piedade algumaEscravizados pela liberdade sem medidaViciados alucinados amordaçadosEstes versos são para os que jazem nas ruasOs que vivem de migalhas e falsa caridadeAqueles de quem desviamos os nossos olhosE meneamos a cabeça como se fôssemos diferentesEste é o cântico dos desvalidosOs pequenos de quem roubamos a esperançaOs que se alimentam de sujeira e podridãoOs seres invisíveis de nossas cidadesEste é o lamento que não se ouvePorque somos cegos e surdos e mudosPorque vivemos de arrogância e estupidezE nos conformamos com nossa mediocridadeAinda há muito para se lamentarE pouca é a vontade de se fazer algoImportância alguma se dá a quem sofreE que o crack consuma a todos
SER URBANO
Sou um ser urbanoE nesse céu cinzentoQue é a origem do meu tormentoEncontro a felicidadeNesse paraíso onde a fumaça reinaNão se ouve canto de pássarosE há muito não existe verdeAqui reside minha alegriaA música que me encantaSai do ronco dos motoresAs bestas metálicas de quatro rodasDe vidros fechados para a realidadeComo tantos outros milharesVagando sozinhos na multidãoExperimento o poder da solidãoE a doce ternura do medoViver aqui em meio aos horroresÉ meu encanto e meu prazerAtrás das grades dos apartamentosEncontro um precioso refúgioEspero que aqui eu complete meus diasVivendo feliz e doente e inseguroVendo os humanos matando uns aos outrosE a ferrugem corroendo tudo lentamenteO que odeio é essa maldita esperançaQue se aninhou em meu coraçãoInsistindo para mim a cada diaQue um mundo melhor é possível